Direitos Humanos

Mães contam casos de crianças adotivas que foram retiradas delas após longa guarda provisória

Em audiência na Câmara, juristas destacam que o conceito de família não se restringe aos laços consanguíneos. “É preciso mudar a mentalidade de que a criança é propriedade de quem a gera”, diz Vitor Bezerra, juiz do Tribunal de Justiça da Bahia.

29/05/2014 - 18:35  

Arquivo/ Gustavo Lima
Liliam Sá
Liliam Sá vai pedir ao CNJ e ao CNMP esclarecimentos sobre os casos.

Em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (29), mães e pais por adoção contaram como tiveram que devolver suas crianças às famílias biológicas, devido a decisões judiciais, após longos períodos de guarda provisória.

Leilane e Márcio Dias criam Rafaela, de 2 anos e 8 meses, desde o nascimento. Mas há sete meses a Justiça decidiu pela devolução da criança aos genitores, que resolveram recorrer ao Judiciário para ter a criança de volta. “Tiraram Rafaela de mim de forma brutal, ela nunca havia dormido longe de mim, os pais biológicos não a conheciam, não sabiam de que ela gostava, o que comia, soube que ela teve vários dias de febre emocional”, contou Leilane.

A Justiça deu o direito de visitação aos pais por adoção a cada 15 dias. “Todos os dias, quando tenho que entregá-la, ela chora e pede para não ir”, continuou Leilane. “Sou uma mãe que perdeu uma filha, que ainda está viva, pede socorro, mas não posso fazer nada. Não importa o que a Justiça disse, eu sou a mãe de Rafaela.” O pai, Márcio, relatou que a família da genitora já os ameaçou de morte. “Se eu tiver que morrer para ter a Rafaela de volta, vou morrer”, disse.

Nicolas
A genitora de Nicolas, hoje com 5 anos, abandonou-o no hospital, e Edna Aparecida Passos acolheu a criança, após consultar não apenas a mãe biológica, como tios e avó do menino. O pai era desconhecido. A genitora passou o direito de guarda para Edna, que entrou com pedido de adoção quando o garoto tinha 3 anos - segundo a mãe por adoção, esperou esse período por orientação da Justiça de Coronel Fabriciano (MG), onde mora.

No entanto, a mãe biológica, dependente química, começou então a querer extorquir dinheiro de Edna, ameaçando-a de retirar a criança, e ela se recusou a pagar qualquer quantia. Há 43 dias, uma juíza determinou que Nicolas ficasse com a genitora. “Só eu cuidei dele desde que ele nasceu. Hoje, ele tem 5 anos e nunca tinha dormido uma noite antes sem mim”, contou Edna.

“A criança foi arrancada do seio da família que ela sempre conheceu”, afirmou a deputada Liliam Sá (Pros-RJ), que pediu a audiência. A parlamentar afirmou que vai enviar pedido de esclarecimento sobre os casos ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

Desestímulo à adoção
No debate, a presidente da Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção (Angaad), Suzana Schettini, observou que os episódios de devolução de crianças em processo regular de adoção após longos períodos de guarda provisória desestimulam a adoção no País. “Atualmente, existe uma instabilidade jurídica no mundo da adoção. Pais que estão há vários anos com a guarda provisória se mostram em pânico, temendo que as crianças possam ser retirada deles”, declarou. “O processo legal não significa seguro mais, o que causa constrangimento”, completou.

Reportagem – Lara Haje
Edição – Marcelo Oliveira

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