Direitos Humanos

Adiado parecer sobre a suspensão condicional de processo de violência doméstica

Após polêmica sobre a negociação de acordo com o agressor, relatora decidiu adiar apresentação de parecer sobre projeto que altera a Lei Maria da Penha.

10/04/2014 - 15:01  

Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados
Audiência pública para discutir o PL 4501/12, que dispõe sobre a repressão à violência contra a mulher, alterando dispositivos da Lei Maria da Penha. Dep. Jô Morais (PCdoB-ES)
Jô Moraes: ainda não é o momento de mudar a Lei Maria da Penha, mas o debate deve continuar.

A deputada Jô Moraes (PCdoB-MG) decidiu adiar a apresentação de seu parecer sobre o Projeto de Lei 4501/12, da deputada Aline Corrêa (PP-SP), que faz uma série de alterações na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06). A decisão foi tomada após a audiência pública que discutiu a proposta, nesta quinta-feira, na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados.

Na audiência, causou polêmica principalmente o trecho do projeto que permite a aplicação da suspensão condicional do processo de violência contra a mulher, para a negociação de acordo com o agressor. Pela proposta, para isso, seria necessária a prévia autorização da vítima.

“Percebemos que há ainda uma opinião majoritária contra esse ponto”, disse a relatora Jô Moraes. Embora considere que não seja o momento adequado de promover alterações na Lei Maria da Penha, a deputada acredita que o debate deve continuar. Para não “matar a discussão”, ela prefere não apresentar relatório favorável ou contrário neste momento.

Contra as mudanças
Na audiência, a secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, da Secretaria de Políticas para as Mulheres, da Presidência da República, Aparecida Gonçalves, se manifestou contrariamente a qualquer alteração, neste momento, da Lei Maria da Penha.

Ela lembrou que a lei começou a ser executada efetivamente apenas há sete anos e destacou que a Organização das Nações Unidas (ONU) apontou a Lei Maria da Penha como a melhor lei do mundo.

“Por que queremos mudar a lei? Ela é ineficiente ou é o Estado que é ineficiente ao aplicá-la?” questionou. “Hoje temos no País apenas cerca de 600 delegacias, 90 juizados e 40 defensorias especializadas no atendimento à mulher”, informou.

Posição do CNJ
A conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Ana Maria Amarante Brito também teme que mudanças muito profundas na lei, neste momento, possam prejudicar a sua execução. Segundo ela, o CNJ ainda não tem posição fechada sobre o PL 4501/12, mas ela desde já aponta inconstitucionalidades na proposta.

Além disso, a conselheira apontou a necessidade de um maior debate sobre o ponto mais polêmico da proposta - a possibilidade de suspensão condicional do processo. Ela considera válido o debate, já que a conciliação como método de solução de conflitos está sendo discutida no mundo inteiro.

“Mas haverá condição neste momento de cumprimento da suspensão?”, questionou. “Há temor de esvaziamento do efeito inibitório das penas e do efeito repressivo, para punir o agressor”, observou. Ela criticou ainda o fato de a proposta colocar a decisão de suspender o processo “nos ombros da mulher”.

Polêmica
O promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios Thiago Pierobom de Ávila defendeu a possibilidade de acordos, diante do acúmulo de processos de violência contra a mulher. “O número de processos aumentou de forma assustadora nos últimos anos”, disse.

Para ele, os acordos podem ser uma resposta efetiva do Estado à violência doméstica e uma forma de responsabilização dos réus. Porém, na sua avaliação, os acordos devem considerar o interesse da mulher.

Ávila cita que, assim como em outros países, na França, a maior parte dos casos é solucionada com acordos processuais. Na Espanha também haveria acordos processuais em cerca de 40% dos casos.

Veja entrevista com a promotora de Justiça do Mato Grosso Lindinalva Rodrigues.

Além disso, acrescenta, embora todos os crimes de violência contra a mulher sejam graves, alguns são mais graves que os outros. O projeto não admite a possibilidade de acordo se a vítima estiver em situação de risco ou se o juiz ou o Ministério Público considerarem o crime de especial gravidade.

Morte da lei
Já a promotora de Justiça do Estado de Mato Grosso Lindinalva Rodrigues acredita que essa proposta significa “a morte da lei”.

Conforme a promotora, a lei ainda é aplicada de forma precária. Ela disse que não há estrutura para a fiscalização dos acordos.

Além disso, acredita que os acordos beneficiariam apenas o réu, deixando a vítima com a sensação de impunidade. “Ouvir a vítima para ver se ela concorda com um acordo é um retrocesso inacessível; é deixar o problema para ser resolvido por ela”, afirmou.

Ela considera fundamental a mediação do Estado nesses casos. Para ela, a reeducação do agressor deve ser feita por psicólogos dentro do presídio.

Reportagem – Lara Haje
Edição – Newton Araújo

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