Direitos Humanos

Senado deverá analisar mudanças na Comissão da Verdade, diz Suplicy

18/10/2011 - 19:32  

Reinaldo Ferrigno
Senador Eduardo Suplicy, dep. Domingos Dutra (vice-presidente da CDHM), dep. Edinho Araújo (PMDB-SP) e Antonio Modesto da Silveira (advogado de ex-presos Políticos)
Seminário na Câmara discutiu a criação de comissões da verdade em países latino-americanos.

O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) afirmou nesta terça-feira, em seminário na Câmara, que a Comissão de Direitos Humanos do Senado começou a debater propostas de alteração no projeto do Executivo que cria a Comissão da Verdade (PL 7376/10), aprovado pela Câmara no último dia 21 de setembro. Entre as sugestões, estão: possibilidade de prorrogação do prazo de funcionamento do colegiado por mais dois anos, além dos dois anos já previstos no texto; aumento do número de integrantes, de sete para quinze; redução do período investigado para 1964 a 1985, em vez de 1946 a 1988; e exclusão da possibilidade de participação de militares no grupo.

Essas mudanças já haviam sido reivindicadas por alguns deputados, mas não foram aprovadas na Câmara. Para Luiza Erundina (PSB-SP), que defendeu as alterações, o texto aprovado pela Câmara é tímido e corre o risco de não garantir o esclarecimento dos casos de violação dos direitos humanos ocorridos durante a ditadura. “Todo mundo quer uma comissão da verdade, mas não qualquer uma. É preciso que ela tenha meios suficientes para atuação efetiva”, disse.

O relator da proposta na Câmara, deputado Edinho Araújo (PMDB-SP), contudo, acredita que o texto “representa um grande avanço da democracia brasileira”. Araújo explica que nada impede a prorrogação do prazo de funcionamento do colegiado por meio de outro projeto de lei do Executivo ao fim dos dois anos. Além disso, segundo ele, as investigações da comissão poderão se restringir ao período da ditadura militar (1964 a 1985). “O projeto fala em 1946 a 1988 porque é o período previsto na Constituição para a concessão da anistia, mas a comissão terá autonomia para delimitar seu foco de atuação”, ressaltou.

Apesar das propostas feitas pelos senadores, Erundina acredita que o texto será aprovado pelo Congresso sem alterações. “O governo não quer que o texto retorne à Câmara e, portanto, deverá pedir a aprovação sem emendas no Senado”, explicou. Mas, para Suplicy, o cenário ainda não está tão claro. “Há uma chance de as propostas serem aprovadas. Às vezes se diz que o Senado é mais conservador, mas há situações na história do Congresso em que o Senado chegou a avançar mais do que a Câmara”.

As declarações foram dadas durante o 5º Seminário Latino-Americano de Anistia e Direitos Humanos, que ocorreu hoje durante todo o dia na Câmara.

Lei da Anistia
A professora da Universidade de Brasília Simone Rodrigues Pinto, que também participou do encontro, afirmou que o modo de funcionamento previsto na proposta da Comissão da Verdade do Brasil é bastante parecido com o de colegiados equivalentes instalados em outros países que também enfrentaram a ditadura. A maior diferença, segundo ela, diz respeito à possibilidade de julgamento das pessoas que violaram os direitos humanos na época.

Segundo Simone, na maioria dos países, os fatos apurados pela comissão servem de subsídio para julgamentos posteriores feitos pelo Judiciário – o que não pode ocorrer no Brasil em razão da Lei da Anistia (6683/79). “O Brasil está na contramão das normas internacionais. Como os crimes de desaparecimento são crimes continuados, e os crimes de tortura são contra a humanidade, todo o arcabouço normativo internacional diz que esses crimes não sofrem prescrição nem podem ser anistiados”, afirmou.

Fim da anistia ampla
Um projeto da deputada Luiza Erundina pretende rever essa regra (PL 573/11). A proposta exclui da anistia ampla e irrestrita os agentes públicos que cometeram crimes durante a ditadura militar. Na prática, o texto permite o julgamento, pelo Judiciário, dos agentes públicos que tiverem cometido tortura ou assassinato, por exemplo. O texto, contudo, já foi rejeitado pela Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional. Ele está em fase de análise pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Erundina argumentou que a Lei da Anistia, publicada em 1979, é resultado do desequilíbrio de poder entre militares e representantes da sociedade civil à época. “Hoje, a democracia já avançou, mas esse processo não se consolidou. Se essa lei não for revista, as famílias de pessoas que foram mortas, as vítimas de torturas e estupros e todos aqueles que sofreram com atrocidades serão frustrados”, alertou.

A própria autora, contudo, acredita que a proposta não deverá ser aprovada pela Câmara. “A rejeição aqui ainda é grande. Por isso, hoje devemos contar somente com a pressão da sociedade para que essa comissão da verdade avance durante seu funcionamento e gere resultados efetivos”, disse.

Reportagem –Carolina Pompeu
Edição – Maria Clarice Dias

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