Direito e Justiça

Pais de vítimas da Boate Kiss criticam Ministério Público, que explica decisões

Audiência na Comissão de Direitos Humanos lembrou os mil dias do incêndio na boate

04/11/2015 - 21:00  

Participantes da audiência pública que marcou os mil dias do incêndio da Boate Kiss que matou 242 pessoas em Santa Maria (RS) criticaram, nesta quarta-feira (04), a ação promovida pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) contra três pais de vítimas da tragédia.

Lucio Bernardo Jr. / Câmara dos Deputados
Audiência pública para lembrar os 1000 dias da tragédia na boate kiss: situação das investigações e prevenção de novos incêndios
Participantes levaram fotos das vítimas da tragédia na Boate Kiss: "Dois anos e meio após a tragédia, os únicos culpados são os pais", denunciou um deles

O presidente do movimento Santa Maria do Luto à Luta, Flávio José da Silva, afirmou que tornou público parte do processo e, por isso, foi processado pelo MPRS. “O único crime que cometi foi o excesso de verdade, quando apresentei o termo de ajustamento de conduta entre a prefeitura e o Ministério Público. Tanto o MP, quanto o prefeito sabiam das irregularidades da boate e permitiram que ela funcionasse. Mas acho que em um assassinato que envolve 242 jovens, temos uma obrigação moral muito grande para que a justiça seja feita”, criticou.

O presidente da Associação dos Familiares das Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria, Sérgio Silva, que é processado junto com Flávio, também criticou a ação. Segundo ele, os pais cobraram da instituição a responsabilização de gestores municipais na tragédia e criticaram a condução no andamento do processo. “Dois anos e meio após a tragédia, os únicos culpados são os pais”, lamentou.

Sérgio Silva contou que o Ministério Público do RS chegou a propor acordo, mas eles negaram. “O acordo proposto pelo Ministério Público é que os pais deveriam pagar uma cesta básica, um salário mínimo e se apresentar à Justiça a cada dois anos. Vocês acham que depois de perder um filho, vou me preocupar em ficar um ano na cadeia? Vamos deixar o processo correr e ver onde isso vai dar”, afirmou.

Processo lento
O diretor jurídico da Associação dos Familiares das Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria, Paulo Carvalho, criticou a lentidão do processo que pede a punição dos culpados da tragédia. “Em mil dias não temos nenhum culpado, nem do setor público, nem do setor privado. Estamos fazendo as denúncias, explicando o absurdo que ocorreu, e os promotores do Ministério Publico estão processando três pais. Eles sentaram em cima do processo”, denunciou. “Que nossos filhos não tenham sido levados em vão! Eles não podem ter sido levados embora por pessoas gananciosas e omissas de suas funções”, afirmou Carvalho, que também é processado pelo MPRS.

Decisões técnicas
O subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais do Rio Grande do Sul, Fabiano Dallazen, afirmou que a instituição está presente desde o primeiro momento e atuou de maneira técnica. “O Ministério Público está e sempre vai estar ao lado das vítimas e dos familiares, em todos os aspectos, para buscar agilidade nos processos”, disse.

O representante do Ministério Público explicou que o inquérito inicial da Polícia Civil indiciou várias pessoas, mas por decisão técnica, optou pela denúncia e pelo processo por homicídio doloso (com intenção de matar) contra os dois sócios da boate e dois integrantes da banda que acenderam o artefato que provocou o incêndio.

O Ministério Público entendeu que não houve dolo em outros dois processos que apuram procedimentos equivocados, mas resultou em mais de 60 pessoas denunciadas. “Todas as manifestações têm possibilidade de correção. Mas todas elas estão devidamente fundamentadas”, defendeu Dallazen.

Corporativismo
O deputado Nelson Marchezan Junior (PSDB-RS) criticou o Ministério Público “Ele deu péssimos exemplos. Foi uma atitude corporativista. Parece que é um grande acordão”, criticou.

O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) propôs que o Ministério Público do RS retire o processo. Para Chinaglia, não se pode conceber que promotores processem pais, cujos filhos foram vítimas de uma tragédia, por terem eventualmente feito críticas mais duras à instituição. “Em uma situação dessas, nós [deputados] temos o dever moral de ficar do lado das famílias”, afirmou o parlamentar. Ele sugeriu a criação de uma comissão externa para fiscalizar o andamento do processo e as ações do Poder Público realizadas para atenuar o sofrimento dos sobreviventes.

Lei Kiss
O presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Paulo Pimenta (PT-RS), solicitou o debate para discutir o que foi e o que não foi feito em relação ao desastre na Boate Kiss, para conhecer a realidade das famílias, das investigações e o que mudou na legislação para as casas noturnas.
Pimenta criticou a alteração do texto, no Senado, do projeto (PL 4947/13 na Câmara) que torna mais rigorosa a fiscalização de casas noturnas. Ele defendeu que a Câmara mantenha o texto original quando o projeto retornar.

Documentário
Durante a audiência pública, foi lançado o documentário “Janeiro 27” dos cineastas Luiz Alberto Cassol e Paulo Nascimento. O trailer do documentário foi exibido em setembro deste ano no Festival do Cinema Latino Americano de Trieste, na Itália.

Reportagem - Luiz Gustavo Xavier
Edição - Luciana Cesar

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