Direito e Justiça

Procurador da Operação Zelotes pede reforma do Conselho de Recursos Fiscais

Operação Zelotes investiga a sonegação de impostos por meio da manipulação de julgamentos do conselho entre 2005 e 2013

13/05/2015 - 18:37  

O procurador da República Frederico Paiva disse nesta quarta-feira (13) à Câmara dos Deputados que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) – órgão ligado ao Ministério da Fazenda – é “ineficiente, pouco transparente, burocrático e necessita de uma reforma [estrutural]”. O Carf é uma espécie de tribunal administrativo formado por 216 conselheiros para julgar débitos tributários de empresas com o Fisco nacional.

Luis Macedo/Câmara dos Deputados
Audiência pública para esclarecer o andamento de investigações alusivas ao Sistema Tributário Nacional no âmbito da Operação Zelotes. Procurador do 6º Ofício de Combate à Corrupção da Procuradoria da República no Distrito Federal, responsável pelas investigações da Operação Zelotes, Frederico de Carvalho Paiva
Frederico Paiva: "O modelo atual tem se revelado propício à corrupção, ao tráfico de influência e à advocacia administrativa"

Membro do Ministério Público Federal, Paiva responde pelo 6º Ofício de Combate à Corrupção da Procuradoria da República no Distrito Federal e é responsável pelas investigações da Operação Zelotes, da Polícia Federal, que apura a sonegação de impostos por meio da manipulação de julgamentos do Carf entre 2005 e 2013.

“Há uma clara necessidade de modificação do Carf. O modelo atual tem se revelado propício à corrupção, ao tráfico de influência e à advocacia administrativa”, disse ele, durante audiência na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle. A reunião foi proposta pelos deputados do PT Paulo Pimenta (RS) e Leo de Brito (AC).

Em resposta a Brito, Paiva disse que o modelo atual de escolha dos conselheiros é falho e questionou a composição paritária do Carf – com metade dos conselheiros escolhidos pelo Ministério da Fazenda e a outra metade entre contribuintes (empresários). “Da maneira que está hoje, [o Carf] só atende ao interesse de pequenos grupos de pessoas, que não estão preocupadas com o interesse público”, disse.

O procurador da República destacou ainda o fato de a legislação tributária brasileira ser complexa e tornar difícil distinguir o que é uma brecha na lei e o que é corrupção. “Essa complexidade certamente interessa a algumas pessoas”, observou. “Mas não estou dizendo que todos os processos envolvendo grandes empresas sejam fruto de manipulação”, ressaltou.

Grandes empresas
Segundo Paiva, o principal foco da Operação Zelotes é a influência de grandes empresas nos julgamentos. “A União vence em 95% dos processos analisados pelo Carf. O problema está nos 5% restantes, que envolvem grandes empresas e representam 80% do valor dos débitos em julgamento no órgão”, salientou.

O valor total dos débitos tributários em análise no Carf hoje chega a R$ 516 bilhões. Segundo o procurador, em pelo menos 74 processos – que somam R$ 19 bilhões – há suspeita de manipulação ou favorecimento nos julgamentos.

“Em média, um processo leva até oito anos para ser julgado pelo Carf. E, enquanto o Carf não julga, a Receita Federal não pode cobrar os tributos”, acrescentou Paiva, para quem a ineficiência e a falta de transparência do órgão favorece a ação de organizações criminosas.

Esquema de corrupção
Em resposta ao deputado Paulo Pimenta (PT-RS), Paiva detalhou o funcionamento do esquema de corrupção montado no Carf. Ele afirmou que as empresas detentoras de débito eram abordadas por escritórios de advocacia ou de contabilidade, com uma conversa do tipo: “Sabemos que vocês têm um processo no Carf e estamos dispostos a oferecer nosso serviço”.

Segundo Paiva, a partir daí o próximo passo seria a empresa com débito fechar um contrato de consultoria com essas quadrilhas de manipulação de julgamentos no Carf para dar legalidade à transferência de recursos que alimentava o esquema. Os pagamentos eram geralmente feitos com saques em dinheiro na boca do caixa, para dificultar rastreamento.

Pimenta também chamou atenção para uma súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal (STF) que impede a Polícia Federal e o Ministério Público Federal de investigar processos que envolvam suspeitas de sonegação fiscal em análise no Carf. “Então, o negócio é sonegar sempre, porque você tem até oito anos para admitir que houve sonegação e aí optar por um programa de refinanciamento, como o Refis [Programa de Recuperação Fiscal], e ter assim anulado o crime de sonegação fiscal”, criticou o parlamentar.

Por fim, o procurador da República destacou o papel do Poder Judiciário como agente de combate à corrupção, ao autorizar medidas invasivas que possam elucidar o caso por meio de provas concretas. A prisão de 26 pessoas, segundo Paiva, teve o objetivo de neutralizar o “núcleo que atuava de maneira mais incisiva”, para evitar que elas pudessem combinar previamente os depoimentos.

Reportagem – Murilo Souza
Edição – Pierre Triboli

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