Agropecuária

Visita de deputados a Raposa Serra do Sol revela abandono de terras

Entidade indígena defende demarcação e afirma que região precisará de 15 anos para se recuperar das consequências de uma "ocupação predatória".

15/04/2013 - 21:29   •   Atualizado em 17/04/2013 - 16:02

Wilson Silveira
Vista Aérea da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol
Vista aérea da reserva: ausência das plantações de arroz existentes quatro anos atrás.

Quatro deputados da Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e da Amazônia sobrevoaram, nesta segunda feira (15), uma parte da reserva indígena Raposa Serra do Sol que era ocupada por fazendeiros. A Agência Câmara acompanhou o sobrevoo. O que se viu durante todo o trajeto, que durou uma hora, é uma enorme área desocupada e com aparência de deserto, para quem vê do alto, pelo fato de a vegetação ser rasteira, como um capim seco.

Há pouquíssimos lugares com mata, que é rara nesse tipo de vegetação, conhecida como lavrado. Na área sobrevoada, até quatro anos atrás, havia milhares de hectares de plantação de arroz irrigado. Não há mais sinal dessas plantações nem das fazendas. Não se vê nenhuma lavoura.

Uma outra equipe de jornalistas seguiu por terra, em outra área da reserva que também era ocupada por fazendeiros -- expulsos há quatro anos por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF). No trajeto de mais de 500 km, não encontraram nenhuma plantação. Foram vistas várias pequenas comunidades indígenas, com cerca de duas ou três casas cada uma, separadas por distâncias que variam de aproximadamente um a dez quilômetros. A maior comunidade tinha dez casas, e havia no local, naquele momento, cerca de 20 índios.

Alguns dos índios encontrados no trajeto, defensores da demarcação da reserva e da expulsão dos não índios, foram hostis à presença de jornalistas na área. Outros disseram ter medo dos arrozeiros, pois muitos destruíram as plantações e benfeitorias quando foram expulsos. Outros disseram que sua vida piorou muito após a demarcação, pois perderam a única fonte de renda que tinham, que era o trabalho para os fazendeiros.

A estrada está em péssimas condições e deverá ficar intransitável durante boa parte do período de chuvas, que dura três meses, pois extensas áreas são alagadas. A área é plana, e o cenário é de desolação até onde a vista alcança.

Impacto econômico
Os deputados quiseram mostrar com essa viagem que a demarcação da reserva e a expulsão dos não indios, em marco de 2009, foi desastre para a economia do estado, para os fazendeiros e até para os índios. Muitos deles trabalhavam nas fazendas e, após a demarcação, foram morar em Boa Vista. Outros continuam lá, mas vivendo com renda de programas sociais, por não terem condições de se autossustentarem. Muitos eram casados com não brancos e optaram por sair para não se separar dos cônjuges e filhos, que foram obrigados a sair da reserva.

Os parlamentares sabem que a reserva é irreversível, mas querem que sirva de exemplo para barrar demarcacões em outros estados. Para eles, a demarcação de terras indígenas no Brasil atingiu o limite. O presidente da Comissão de Integração Nacional, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), disse que 1/3 das terras agricultáveis no Brasil estão demarcadas ou em processo de demarcação, por terem sido consideradas áreas indígenas ou quilombolas. O deputado afirmou que a Amazônia hoje já está tomada por áreas indígenas, por isso a "indústria da

s demarcações se voltou para o Centro-Oeste e o Sul". Quase metade do estado de Roraima, por exemplo, é ocupado pelas reservas Raposa Serra do Sol, Yanomami e São Marcos.

Indígenas defendem demarcação
O Conselho Indígena de Roraima (CIR), que lutou pela demarcação, informou que cerca de 25 mil índios habitam a região. A entidade defende que o processo foi um sucesso e nega que a maioria esteja em dificuldades para sobreviver com o fruto do seu trabalho. Segundo o coordenador-geral do CIR, Mario Wapichana, muitos índios criam gado e outros plantam mandioca e milho, principalmente, e vendem o excedente para comprar os gêneros alimentícios de que não dispõem.

Odilon Burlet/Câmara dos Deputados
Direitos Humanos e Minorias - Índios - Reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima
Vista terrestre da Raposa Serra do Sol: aparência de deserto.

Na opinião de Mario, a região da reserva visitada pelos jornalistas sofre as consequências de uma ocupação predatória, que incluiria o despejo de agrotóxicos em rios e a destruição de mata ciliar. Segundo ele, serão necessários cerca de 15 anos para a recuperação dessas áreas, por processos naturais.

O índio Aguinaldo Macuxi, que vive na reserva, também defendeu a demarcação: "Nós estamos com plantio de feijão, com plantio de milho, de mandioca e criação de gado. Nós estamos com 500 reses aqui dentro da fazenda. Pela conversa dos políticos, os deputados dizem que nós estamos morrendo de fome, mas ninguém está morrendo de fome”, disse.

Comitiva
A comitiva que visita Roraima é liderada pelo presidente da comissão, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), e integrada por mais quatro deputados: Marcio Junqueira (DEM-RR), Marcelo Castro (PMDB-PI), Paulo Cesar Quartiero (DEM-RR) e Raul Lima (PSD-RR). Junqueira fez o trajeto por terra; os demais, de avião.

Quartiero ressaltou que tinha duas fazendas na área da reserva. Ele mostrou extensas regiões que eram ocupadas por plantações de arroz irrigado. De acordo com o parlamentar, os fazendeiros utilizavam bombas para retirar água de rios e, assim, não dependiam de chuvas. "Exploramos milhares e milhares de hectares de terra sem derrubar nenhuma árvore, pois há extensas regiões sem nenhuma árvore", sustentou.

Reportagem - Wilson Silveira, enviado especial a Boa Vista
Edição - Marcelo Oliveira

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