Política e Administração Pública

Especialistas sugerem outros pontos polêmicos ao projeto contra a corrupção

04/10/2016 - 14:09  

Na audiência desta terça-feira (4), o representante do Tribunal de Contas da União (TCU), Rafael Jardim Cavalcante, da Secretaria Extraordinária de Operações Especiais em Infraestrutura do órgão, fez uma sugestão aos deputados da comissão: acrescentar no projeto autorização para que o TCU tenha acesso aos bancos de dados e informações contábeis das empresas investigadas, principalmente dados fiscais. “Não se trata de quebra de sigilo. As informações continuam em poder do Estado e são necessárias para que os auditores identifiquem casos de despesas fictícias destinadas a justificar desvios”, disse.

O ex-ministro-chefe da Controladoria Geral da União, Valdir Simão, discordou da proposta. “Ela fere o Código Tributário. Temos que pensar em outra forma de compartilhamento que inclua as controladorias”, disse. O ex-ministro também fez reparos ao trecho que trata do enriquecimento ilícito do servidor público, que passa a ser crime. Ele defendeu o compartilhamento dos dados das declarações de Imposto de Renda dos servidores públicos para órgãos de controle interno, como as controladorias. “Seria possível, assim, acompanhar a evolução patrimonial dos servidores”, disse.

Leniência
Simão também pediu mudanças no trecho que trata do acordo de leniência. “A reparação do dano deveria ser condição para o acordo de leniência e a entidade lesada também tem o direito de participar do acordo, não apenas o Ministério Público”, disse. Ele sugeriu ainda a possibilidade de acordo de leniência por parte de partido político responsabilizado por caixa-dois eleitoral ou uso de recursos ilícitos.

Conselheiros de tribunais
Amauri Perusso, presidente da Federação Nacional das Entidades dos Servidores dos Tribunais de Contas do Brasil (FENASTC) e representante dos funcionários dos 34 tribunais de contas do País, defendeu medidas que não constam do projeto, mas que, segundo ele, são fundamentais para o combate à corrupção, como mudanças na forma de escolha de ministros e conselheiros dos tribunais de contas.

Ele também pediu mais transparência e publicidade para os relatórios de auditoria; a criação de um conselho nacional para os tribunais de contas (a exemplo dos que já existem para o Judiciário e Ministério Público), com participação de representantes da sociedade; e autonomia para os auditores.

“Existe hoje quantidade significativa de ministros e conselheiros sob investigação. O artigo 73 da Constituição estabelece requisitos para a escolha de ministros e conselheiros. Eles têm que ter conhecimento técnico, idoneidade moral e conduta ilibada, o que tem sido descumprido”, disse.

Teto de gastos
Perusso pediu aos deputados da comissão que não aprovem a proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241/16, que limita os gastos públicos por 20 anos. “Isso também tem a ver com corrupção. Congelar gastos vai dificultar o combate à corrupção e a atuação dos órgãos responsáveis por isso. Nós não vamos conseguir repor quadros, é uma ameaça enorme. E tudo para pagar juros da dívida”, disse.

As propostas também dividiram os deputados da comissão. O deputado Valdir Colatto (PMDB-SC) pediu uma definição mais precisa de caixa-dois eleitoral. “Essa foi a eleição que mais usou caixa dois, já que foi proibida a doação de empresas e não houve de pessoas físicas. Desafio é tipificar o que é caixa dois. É abastecer um carro?”, perguntou.

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP), considera as medidas inconstitucionais. “Ouvi falas aqui hoje que desconsideram a Constituição. Não podemos corromper a Constituição”, disse.

Divulgação
Cartaz do Seminário de Combate à Corrupção
Texto em análise na Câmara é polêmico

Divergências se acumulam
Até agora, 65 especialistas foram convidados a debater o projeto que estabelece medidas contra a corrupção (PL 4850/16), as chamadas “Dez medidas contra a corrupção”. O texto divide a comunidade acadêmica, os órgãos de controle, o Judiciário, o Executivo e o Ministério Público. As propostas não têm obtido consenso entre juristas, juízes, advogados, membros do Ministério Público e representantes da sociedade civil nas audiências públicas da comissão especial.

Convidados ouvidos em audiências públicas anteriores apontam que algumas medidas previstas no projeto, como restrições à concessão de habeas corpus, o teste de integridade para servidores públicos e a validação de provas ilícitas em determinadas situações ferem as garantias individuais previstas na Constituição.

Outros, em especial representantes do Ministério Público e de movimentos de combate à corrupção, argumentam que as medidas previnem a ocorrência de crimes, agilizam as decisões judiciais e garantem a punição dos culpados.

O projeto também divide os parlamentares. O texto criminaliza o uso de caixa-dois em campanhas eleitorais e o enriquecimento ilícito de servidores públicos, permite o confisco de bens de condenados por enriquecimento ilícito mesmo quando não há provas de que foi fruto de corrupção, aumenta as penas de vários crimes ligados à corrupção e permite ao juiz não aceitar recursos que considerar apenas protelatórios.

Reportagem - Antonio Vital
Edição - Alexandre Pôrto

A reprodução das notícias é autorizada desde que contenha a assinatura 'Agência Câmara Notícias'.


Sua opinião sobre: PL 3855/2019

Íntegra da proposta