Política e Administração Pública

Com proposta, caixa dois passa a ser crime e partido é responsabilizado

Texto em análise na Câmara também classifica a corrupção como crime hediondo e permite o confisco do bem mesmo quando não houver provas de que o patrimônio é fruto de corrupção

09/09/2016 - 13:04  

O projeto que estabelece medidas contra a corrupção (PL 4850/16) criminaliza o caixa dois (contabilidade paralela) em campanhas políticas, com pena de reclusão de 2 a 5 anos; e a lavagem de dinheiro para fins eleitorais, com pena de reclusão de 3 a 10 anos.

Os partidos políticos (Lei 9.096/95) também serão responsabilizados pelo caixa dois e por atos contra a administração pública, de acordo com a Lei Anticorrupção (12.846/13). Também responderá o partido que utilizar, para fins eleitorais, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal, de fontes de recursos vedadas pela legislação eleitoral ou que não tenham sido contabilizados na forma exigida pela lei. Além disso, a fusão ou incorporação de partidos transmitirão a responsabilidade do crime para o novo partido.

O partido condenado ficará sujeito ao pagamento de multa de, no mínimo, 10% do repasse do fundo partidário, e à suspensão de 2 a 4 anos do diretório onde ocorreram as irregularidades. O Ministério Público Eleitoral (MPE) poderá ainda pedir o cancelamento do registro do partido, se as irregularidades forem de responsabilidade do diretório nacional.

Aumento de pena
O texto em análise na Câmara dos Deputados também aumenta, de 2 para 4 anos, a pena mínima de vários crimes ligados à corrupção, como o peculato e a corrupção ativa e passiva. Com a mudança, o condenado – mesmo sendo réu primário – não poderá cumprir a pena em regime aberto.

Além disso, o texto propõe uma gradação para a pena, de acordo com o valor do prejuízo gerado pelo crime aos cofres públicos. Assim, em casos de corrupção que ultrapassem dez salários mínimos, por exemplo, a pena será de 12 a 25 anos de reclusão. Essa inovação, de acordo com o Ministério Público, foi inspirada na experiência adotada pela justiça dos Estados Unidos.

Na opinião do procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, a pena da corrupção atualmente é “uma piada de mau gosto”, em que pode haver progressão de regime ou substituição de pena.

Crime hediondo
A proposta também enquadra crimes ligados à corrupção na Lei de Crimes Hediondos (8.072/90) quando o ganho com o delito ultrapassar cem salários mínimos. Assim, crimes como peculato passam a se equiparar aos de latrocínio e estupro na legislação.

“Não é razoável que o grande corrupto saia beneficiado por indulto. Na ação penal 470 [Mensalão] já tivemos pessoas com alto poder político, condenadas por crimes de corrupção que machucaram o País, e eles foram beneficiados por indulto exatamente porque era permitido”, reclama o presidente da Associação Brasileira dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti.

O deputado Carlos Marun (PMDB-MS), no entanto, é contra classificar a corrupção como crime hediondo. “Crimes hediondos são aqueles que atentam contra a integridade da pessoa humana. Deveríamos concentrar nesses tipos de crime a característica de hediondo.”

Mas o deputado João Campos (PRB-GO) lembra que a lei já tem um conjunto de benefícios para quem está sendo processado. “Se classificamos como crime hediondo fica mais difícil conceder esses benefícios, nós estaríamos endurecendo a legislação nesse aspecto.”

Confisco alargado
Outra alteração sugerida pela proposta no Código Penal é a instituição do chamado “confisco alargado”, que é o confisco do patrimônio do réu considerado corrupto mesmo quando não existirem provas de que aquele bem é fruto de corrupção.

Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados
Audiência Pública sobre o PL 4850/16, estabelece medidas contra a corrupção. Procurador da República, Dr. Deltan Dallagnol
Dallagnol (C): pena atual da corrupção é “piada de mau gosto”

“O confisco alargado permite que, em crimes graves como tráfico de drogas e corrupção, se atinja não só a corrupção que você comprovou, mas a diferença entre o patrimônio total da pessoa e o patrimônio legal”, explica Dallagnol. Segundo ele, a prática já é adotada em países como Alemanha e Espanha.

Perda de bens
Além disso, o texto permite à Justiça declarar a perda de bens obtidos de forma ilícita, independentemente da responsabilização do autor da infração. Para justificar a ação deve ficar comprovada a origem ilícita do bem, a ausência de título de aquisição e a incompatibilidade entre o patrimônio adquirido e a renda.

Se o crime tiver sido praticado em outro país, haverá a perda de bens situados no Brasil. Mesmo se o criminoso buscar repassar os bens de atividades ilícitas por doação ou herança, a justiça poderá decretar a perda.

A mudança foi sugerida a partir de discussões de mais de uma década promovidas pela Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Ativos (Enccla). Instituída em 2003, sob a coordenação do Ministério da Justiça, a Enccla é formada por mais de 60 órgãos – dos três Poderes da República, do Ministério Público e da sociedade civil – que atuam, direta ou indiretamente, na prevenção e combate à corrupção e à lavagem de dinheiro.

Reportagem – Tiago Miranda
Edição – Natalia Doederlein

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