Especialistas destacam medidas para humanização do parto

A Comissão de Seguridade Social e Família promoveu, nesta terça-feira (14) uma audiência pública para debater o parto no Brasil com ênfase ao parto normal no âmbito do SUS. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o parto é um ato natural. De acordo com a instituição, se tudo estiver bem com mãe e com a criança, o nascimento é um processo fisiológico que requer pouca intervenção médica. A cesárea, cirurgia de médio porte, é recomendada em casos de complicações reais para a mulher e para o bebê e necessita, portanto, de indicação médica. Conforme a OMS, o índice aceitável de cesarianas fica em torno de 15%.
14/04/2015 16h35

Lucio Bernardo Jr. / Câmara dos Deputados

Especialistas destacam medidas para humanização do parto

Mas hoje, 56% dos partos realizados no Brasil são cesarianas. O índice – que é de 38% no SUS – chega a 88% na rede privada. Para reduzir esses números o Ministério da Saúde anunciou, em janeiro, uma série de medidas para estimular a realização de partos normais e reduzir o alto índice de cesáreas desnecessárias no País.

Maria Vilela, coordenadora Geral de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde, destacou que a mortalidade materna vem diminuindo no país e que o modelo brasileiro corrobora para isso. A criação da Rede Cegonha, segundo ela, é uma das iniciativas que ajudam a melhorar a situação. Além disso, o Ministério está investindo na qualificação da assistência ao parto. “Temos o desafio de implementar uma rede de cuidados para assegurar às mulheres o direito ao planejamento reprodutivo e a atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério e também assegurar às crianças o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e desenvolvimento saudáveis”, ressalta. Vilela afirma ainda que é preciso mudar a estrutura das maternidades, construir mais centros de partos, treinar pessoal especializado para atuar em obstetrícia e também mudar o currículo das escolas superiores que formam obstetras.

Para Edi Alves, da Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros, urge reduzir o quadro de violência obstétrica. Ele ressaltou que hoje existem 58 cursos de especialização em enfermagem obstétrica e, na maioria deles, a orientação é para humanizar cada vez mais o parto. “A maioria dos partos acontece em ambiente hospitalar e porque ainda assim morrem tantas mulheres? É porque existem intervenções desnecessárias, falta privacidade para gestante, o modelo é intervencionista, tecnocrático e masculino. Precisamos mudar, dar mais ênfase na importância do diálogo, nas metodologias não farmacológicas e qualificar a preparação profissional de quem trabalha na área”, destacou. O enfermeiro também afirmou que teses de mestrado mostram que o parto assistido por uma enfermeira custa 300% mais barato que o assistido por um médico.

SUS

O parto normal é o procedimento mais procurado no Sistema por usuárias de plano de saúde. Somente no período de 2008 a 2012, 96.223 mulheres que possuem convênio médico realizaram seus partos na rede pública. O dado é do mapeamento divulgado pela Agência Nacional de saúde Suplementar (ANS) e pelo Ministério da Saúde sobre as operações de ressarcimento financeiro  realizadas ao SUS pelas operadoras de planos de saúde. De acordo com a legislação, quando usuários de planos de saúde utilizam a rede pública, as operadoras precisam reembolsar o SUS pelo serviço.

Vera Sampaio Souza, gerente de Regulação de Saúde da Diretoria Executiva da Federação Nacional de Saúde Suplementar, falou sobre a Resolução Normativa na ANS que determina procedimentos para a humanização do parto. A resolução entra em vigor em junho próximo. Dados como número de cesarianas por operadora, cartão da gestante para os atendimentos e partograma (registro do trabalho de parto e que indica a necessidade ou não de cesariana) vinculado ao pagamento, são algumas das medidas para tornar mais rigoroso e transparente as estatísticas sobre partos com cesariana.

Alertas

O médico João Batista Lima, diretor clínico do Hospital Sofia Feldman de Belo Horizonte, lembrou que na Inglaterra no início dos anos 90 foram feitas uma série de mudanças em condutas para realização de partos, surgidas no Parlamento daquele país. Ele defende que a discussão não é sobre se o parto é com cesárea ou não, e sim o modelo de atendimento às gestantes. “A base de tudo é a família e a gestante. Diante disso, não é preponderante se vai ser atendida por um tipo de profissional ou outro. Porém, se quisermos mudar o sistema de obstetrícia no país temos que incentivar a formação de mais enfermeiros obstetras”, alertou o médico, que defendeu ainda o trabalho das doulas.   

Já Carmen Grilo Diniz, docente do Departamento de Saúde Materno-Infantil da Faculdade de Saúde Pública da USP alertou que estudos mostram que a cesariana pode ter consequências como doenças crônicas como asma, obesidade, diabetes tipo 1 ou até alguns tipo de câncer como leucemia. “O que é chamado de parto normal no Brasil é extremamente violento, não há regulação das intervenções e a cesárea acaba sendo uma forma de defesa da violência obstétrica. A mulher não tem escolha”, afirma Carmen.

Karla Coelho, gerente de Assistência à Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar, informou que a discussão sobre o modelo brasileiro de obstetrícia está sendo discutido com movimentos de mulheres, academia, Ministério da Saúde e profissionais do setor. “A cesariana é uma epidemia no Brasil. Claro, em alguns casos específicos pode salvar vidas de mães e crianças, mas vai muito além  disso”, ressaltou. Karla acrescentou que todos os partos são auditados pela Agência e em alguns hospitais está sendo reduzido o número de cesarianas. 

Deputados afirmaram que, apesar de todos os avanços, ainda há muito que fazer para ajustar o país aos procedimentos para um parto humanizado. Também lembraram os possíveis interesses econômicos e mercadológicos que acabam indo contra as medidas que promovem a saúde.  Os parlamentares presentes na audiência pública defenderam ainda que o parto humanizado seja tratado de forma sistêmica.

Assessoria CSSF