Direito das mulheres à cidade é discutido em Audiência Pública

CDU participou do debate a convite da Comissão da Mulher
15/06/2018 15h40

Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Direito das mulheres à cidade é discutido em Audiência Pública

A Comissão de Desenvolvimento Urbano (CDU) participou nesta quinta-feira (14/6), a convite da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher (CMulher), de audiência pública sobre o direito das mulheres à cidade. A Presidenta da CDU, Margarida Salomão (PT/MG), esteve nos debates junto com especialistas que militam em prol dos direitos das mulheres. Foram discutidos temas como: o espaço das mulheres na cidade; a participação feminina na gestão do espaço público; como a cidade interfere na reprodução das desigualdades de gênero, e como contribuir na construção da igualdade, na qualificação da democracia e na realização da justiça social.

A audiência foi fruto de requerimento, aprovado na CMulher, de autoria das Deputadas Ana Perugini (PT/SP), Presidenta da Comissão das Mulheres, e Margarida Salomão. Na abertura da audiência, Ana Perugini reforçou a importância dos debates, principalmente devido às dificuldades vividas pelas mulheres nas cidades, e à necessidade de se vencer esses desafios, em especial diante do quadro atual de congelamento de gastos por 20 anos.

A Deputada Margarida Salomão destacou que os centros urbanos são palco de segregação, em especial contra as mulheres. Essa conduta é visível não somente no transporte público, bem como em pequenas tarefas do cotidiano feminino, conforme observou. Para ela, debater essas questões é uma forma de criar um diálogo aberto na sociedade, gerando sugestões que possam subsidiar mudanças legislativas. “Há lugares em que mulheres não vão ou que não devem ir desacompanhadas. Então a cidade para nós é menor do que é para os homens”, desabafou.


Desigualdade

Diante disso, Terezinha Gonzaga, professora da Unifev (Centro Universitário de Votuporanga – SP), asseverou que a mulher é agente de produção nas cidades, mas não usufrui os seus direitos.  “As praças, as calçadas, os parques e o transito são espaços que nos violentam e amedrontam” explicou. A professora lembrou o caso Marielle Franco que chocou o país. “Marielle se apoderou dos espaços urbanos. Ela galgou um ambiente de poder da fala, onde muitas vezes seu corpo, sua cor, sua orientação sexual foi desclassificada”, reiterou.

Sonia Coelho, representante da Marcha Mundial das Mulheres (MMM), esclareceu que as cidades ainda são marcadas pelo colonialismo e isso está estampado no nome das ruas, nas estatuetas e na própria segregação. Ela defendeu a ação do governo como instrumento central para a mudança dos padrões de desigualdade, e reforçou o papel da mulher nos ambientes econômicos. “É preciso investir na autonomia das mulheres como um fator essencial para a construção da igualdade. Assim, é possível desenvolver a cidade com qualidade de vida”

Assim como Sonia, a arquiteta e urbanista Joice Berth lembrou que é preciso fazer uma leitura do passado, buscando identificar como surgiram as dificuldades pelas quais passam as mulheres, a fim de se propor soluções efetivas. Como reflexo da atualidade, ela cita as chamadas “opressões estruturais, atuando na maneira como as mulheres vivenciam a cidade e estão distribuídas nesses espaços, como no caso do racismo e do machismo”. Essas opressões, segundo ela, participaram ativamente do processo de formação e construção das cidades e estão internalizadas no senso comum da população. A partir dessa mentalidade, ela lembra que as mulheres se privam de uma série de questões e espaços nas cidades, devido a uma formação identitária extremamente prejudicada.


Flavia Gianini, uma das organizadoras do ato “Então eu grito”, esclareceu que o assédio no transporte público é o sinal mais claro da negação da mulher em ocupar espaços de uso comum. “O assédio é um sintoma estrutural do machismo, mas é também uma dificuldade do poder público em dar uma resposta efetiva para uma questão que é de extrema importância”. A jornalista afirma que uma das maiores dificuldades na denúncia do assédio sexual é sua tipificação como contravenção penal. “Não é uma contravenção, é um crime e a mulher precisa ocupar esse espaço para sobreviver”, criticou.


Direito às Cidades

A expositora Claudia Bonalume, doutoranda em Estudos do Lazer na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e ex-secretária de esportes da Secretaria do Esporte e Lazer de Caxias do Sul, afirmou que, em sua gestão, escutava comentários como “dividir política pública com mulher, aonde já se viu”, mas assumiu o desafio de pensar nas cidades como um ambiente para todos. “A gente queria discutir uma cidade que não fosse para o esporte do homem, mas que fosse uma cidade dos direitos sociais do esporte e lazer para todos”, afirmou.

Sobre o direito ao lazer, Claudia explica que este se difere de comunidade para comunidade e que tem fortes relações com o tempo livre, o espaço disponível e a atitude de quem o pratica. Sobre o lazer feminino, a doutoranda afirma que muitas vezes o lazer está em último lugar na hierarquia de prioridades de uma mulher. “Os conceitos impõem às mulheres restrições na vivência de determinadas práticas, na ocupação de determinados espaços, do desenvolvimento de certas habilidades e na vivência do lazer”, explicou.

A Deputada Luizianne Lins (PT/CE), ex-prefeita de Fortaleza, falou das ações na capital cearense voltadas para as políticas de defesa das mulheres. Ela afirmou ser essencial acabar com a ideia de cidades uniformes, pois as pessoas são diferentes e as políticas impactam cada um de maneira diferente. A cidade é um conjunto de setores sociais de gênero, raça, geração, e precisa ser pensada a partir dessa ótica, principalmente para as mulheres, na busca de uma inclusão e participação ativa nas decisões que afetam a elas diretamente.

Para a Deputada Erika Kokay (PT/DF), a discussão sobre o tema com o recorte de gênero estabelece e dá visibilidade a uma série de ‘paredes de vidro’ e impedimentos das mulheres de se pertencerem às cidades. Reforçou ser preciso “aprofundar a democracia participativa”, defendendo a ocupação dos espaços que são de direito das mulheres, “na luta constante contra a invisibilização da condição das mulheres e do gênero feminino”.