CDHM denuncia racismo da polícia e do Judiciário em debate sobre prisão de Rafael Braga*

A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados (CDHM) denunciou racismo da polícia e do Judiciário em debate sobre a prisão de Rafael Braga, jovem negro condenado a 11 anos de prisão por tráfico de drogas, em flagrante armado pela polícia, segundo relatos apresentados durante audiência pública (nesta quarta-feira). O caso é considerado emblemático pelos deputados e o exemplo perfeito da seletividade da Justiça. O presidente da comissão, deputado Paulão, do PT de Alagoas; e os deputados Wadih Damous e Benedita da Silva, ambos do PT do Rio de Janeiro, estiveram com Rafael Braga, no presídio de Bangu 2, onde cumpre pena. No relato, gravado em vídeo e exibido durante a reunião, Rafael conta em detalhes como foi preso por duas vezes, injustamente.
04/09/2017 11h12

Na primeira, durante as manifestações de junho de 2013, ele, que é catador de material reciclável, havia encontrado duas embalagens de plástico de Pinho Sol e de Água Sanitária. Foi preso e condenado pelo porte de material explosivo. Após conseguir na Justiça passar para o regime aberto, ele foi preso pela segunda vez, em 2016. Conforme contou aos deputados, foi abordado por policiais e questionado sobre traficantes na comunidade onde residia com a mãe, só porque usava tornozeleira eletrônica. Ao negar-se a colaborar, foi preso com 9 gramas de cocaína e pouco mais de meio grama de maconha, plantadas pelos policiais, segundo ele. A defesa pede sua liberdade para que cumpra pena em casa já que contraiu tuberculose na prisão.

 

O advogado Lucas da Silveira Sada, que integra a equipe de defesa de Rafael, aponta erros e incoerências nas duas condenações. Na acusação sobre porte de material explosivo, laudos técnicos confirmaram que a fagulha incendiária só ocorre no coquetel molotov quando a garrafa de vidro se quebra e as embalagens de posse de Rafael eram plásticas. Na condenação por tráfico, a justiça levou em consideração apenas o depoimento dos policiais que fizeram a prisão, procedimento autorizado por uma súmula do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (Súmula 70). O advogado classificou os dois casos de "aberração jurídica" e denunciou o racismo do processo penal:

 

"Rafael é homem, é jovem, é negro, é semianalfabeto e pobre. É a imagem socialmente construída do delinquente que associa o crime e o criminoso a características raciais, estéticas, físicas e econômicas. É com esse estereótipo criminal em mente que as polícias ostensivas do país todo saem às ruas a caça de criminosos. Como funciona o raciocínio policial? Eles viram o Rafael, negro, naquela localidade da vila Cruzeiro, uma localidade que tem tráfico, com uma tornozeleira eletrônica, o estereótipo perfeito do criminoso. Então, na cabeça dos policiais, eles tinham certeza que eles poderiam abordar o Rafael para obter informações, porque eles tinham certeza de que ele era um traficante."

 

Autora do requerimento para a audiência, a deputada Benedita da Silva destacou que a seletividade da Justiça é ainda mais flagrante ao se comparar o caso de Rafael Braga a outro episódio recente envolvendo Breno Borges, jovem empresário do Mato Grosso do Sul, preso com 130 quilos de maconha, armas e munição, em abril deste ano. Em julho, Breno, que é filho de uma desembargadora, conseguiu aguardar o julgamento em liberdade alegando problemas psiquiátricos. Para Benedita, a comparação entre os dois casos é chocante:

 

"Que a gente tenha uma Justiça descente e que saiba dar uma sentença justa. Não dá é pra Rafael pegar 11 anos e quem foi achado com toneladas de drogas e armas ser colocado numa clínica para fazer tratamento. Isso está colocado claramente, é racismo, é preconceito. É uma questão de classe e de raça. Não podemos negar, absolutamente."

 

Integrantes da Comissão de Direitos Humanos da Câmara devem participar de audiência com o presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro para discutir a situação de Rafael Braga. A audiência pública (desta quarta) contou com a presença de Adriana Braga, mãe de Rafael, mas ela pediu para não falar. Os deputados também manifestaram apoio à Campanha pela Liberdade de Rafael Braga, que pode ser acessada pelo site libertemrafaelbraga.wordpress.com.

 

*Reportagem de Geórgia Moraes, para a Agência Câmara