CDHM debate violações de Direitos Humanos contra populações de terrenos ocupados em Minas Gerais

Em uma cena cada vez mais rara nos corredores da Câmara dos Deputados, lideranças de movimentos sociais e moradores de ocupações da região metropolitana de Belo Horizonte lotaram o auditório 9 do Anexo II para audiência pública da CDHM.
19/10/2016 19h35

Cleia Viana / Câmara dos Deputados

CDHM debate violações de Direitos Humanos contra populações de terrenos ocupados em Minas Gerais

A partir de um requerimento do presidente da CDHM, deputado Padre João (PT-MG), a audiência abordou violações de direitos humanos contra populações que vivem em ocupações na capital de Minas Gerais, Belo Horizonte, e em cidades da região metropolitana.

 

A relação do poder público com as famílias que vivem nas ocupações é marcada por abusos e ilegalidades do Estado contra a população. Segundo o Frei Gilvander Luís Moreira, da Comissão Pastoral da Terra, foram mais de 30 ações ilegais contra as famílias, como por exemplo, a falta de realização de audiências de mediação, operações urbanas que privilegiam a especulação imobiliária e a forte repressão policial. “Estamos muito preocupados. Realizamos mais de 100 marchas até a Cidade Administrativa (sede do governo de MG) e a Prefeitura nunca vem à mesa de negociação. Enquanto isso, representantes das construtoras dizem que tem que nos despejar”, afirma.

 

Para Leonardo Péricles Vieira, do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas, a falta de planejamento e de política habitacional dá a tônica da gestão pública. “Entre 1994 e 2016, a Prefeitura construiu apenas 24 mil unidades habitacionais, sendo que 9 mil delas foram para reassentar famílias. Por outro lado, há um déficit estimado de 120 mil famílias sem moradia digna”. O ativista denunciou que foi ameaçado de morte por sua atuação na resistência às ações estatais.

 

O risco de uma tragédia é iminente, alerta Charlene Cristiane Egídio, coordenadora das Ocupações da Izidora, que estão entre as maiores de Belo Horizonte. “Quem vivenciou uma ação da PM sabe, crianças e adolescentes atacados, idosos caídos no chão. A violência contra nós é pesada e os governantes são coniventes. Não é possível que o governador Fernando Pimentel autorize esse despejo e jogue 30 mil pessoas nas ruas de Belo Horizonte”, critica.

 

Lacerda dos Santos Amorim, do Movimento de Luta Popular / Ocupação Willian Rosa, lembra que só o fato de as pessoas irem viver uma ocupação já significa a primeira violação do Estado, ao negar o direito à moradia, previsto na Constituição. “O governo fala em democracia mas não garante perspectiva nenhuma à moradia, diz.

 

O alto índice de urbanização do Brasil, de 87%, o maior da América Latina, contrasta com a exclusão de setores significativos a serviços básicos. Essa é a posição de Mariana Prandini, das Brigadas Populares. “A cidade é pensada para os ricos, com a desigualdade materializada na estrutura das cidades. Água encanada, asfalto tinindo nos bairros ricos, enquanto nos bairros pobres não há serviços básicos, transporte inadequado, cidade excludente. Ocupar é uma luta não só por moradia, mas também pela função social que cumpre. Lutamos por fazer valer a Constituição, o que não cumpre função social não deve ser protegido. É uma aberração”.

 

A membra do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, Dirlene Marques, ressaltou que o Poder Judiciário raramente está ao lado dos mais necessitados. “Até os governos ditos populares acabam frustrando nossos anseios. Não dar condições à moradia para pessoas que têm renda e estão dispostas a obter sua casa por um valor justo, é um atraso econômico e falta de inteligência”.

 

Encaminhamentos

 

O deputado Padre João colocou a assessoria técnica da CDHM à disposição desta pauta e irá monitorar com prioridade a situação. A Comissão atuará sobre o risco iminente de despejo forçado e de massacre nas Ocupações Izidora, em Belo Horizonte; Vitória, em Campo Florido; 1º de Maio e Capelinha, em Betim, e Willian Rosa, em Contagem.

 

A CDHM vai apurar também a denúncia feita hoje de que a rede de saúde e de educação se recusa a atender a crianças e adultos que são oriundos das ocupações, além do acesso limitado ou inexistente ao saneamento básico, energia e água.

 

Além disso, a CDHM intervirá junto à bancada mineira para garantir que os recursos da Emenda Parlamentar para segurança no estado, de R$ 110 milhões, não sejam empregados para a aquisição de armamento ou instrumentos de repressão à luta popular.

 

Padre João fará a articulação para uma reunião entre lideranças das ocupações e o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, além de um diálogo com o prefeito Carlin, de Contagem.